O programa é voltado para corrigir a distorção idade-série em um estado que chegou a ocupar a primeira posição nacional na porcentagem de estudantes que estão fora da idade considerada correta para os estudos. Ygor é um desses estudantes. E foi no programa que ele superou uma grande defasagem: não sabia ler.
"Quando eu entrei aqui eu não sabia de nada, eu não tinha amigos, as professoras começaram a me ensinar a ler. Agora eu estou conseguindo ler e escrever, que eu não sabia direito", conta em vĂdeo do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), parceiro no programa.Garantir que os estudantes sigam o fluxo escolar, não reprovem e aprendam o que é esperado para cada etapa de ensino é uma das formas de garantir que todos concluam os estudos, que como afirmou Yago, são tão necessĂĄrios para a inserção na sociedade.
No Brasil, a educação é obrigatória dos 4 aos 17 anos de idade. Os anos finais do ensino fundamental, etapa que vai do 6Âș ao 9Âș ano, são considerados cruciais. E é cursada, idealmente, entre 11 e 14 anos. Estudos mostram que é uma etapa na qual os estudantes enfrentam grandes mudanças na própria vida, com a entrada na adolescĂȘncia. Também, geralmente, mudam-se para escolas maiores e lidam com aprendizagens mais complexas. Trata-se de um perĂodo considerado determinante para que as pessoas concluam os estudos, até o final do ensino médio.
O abandono dos estudos e a evasão escolar dificultam inclusive a inserção no mercado de trabalho. No Brasil, em 2023, entre os jovens de 15 a 29 anos de idade, cerca de 10 milhões, o equivalente a 22%, não estudavam e não trabalhavam. Cerca de 4 milhões de jovens não estudavam, não trabalhavam e não haviam concluĂdo a educação bĂĄsica - etapa que vai da educação infantil ao ensino médio. Os dados foram compilados pela plataforma QEdu Juventudes e Trabalho, a partir de pesquisas oficiais.
Em Sergipe, o Prosic acelera os estudos, para que os estudantes não fiquem tão atrasados. No fluxo regular, demoraria 4 anos para concluir os anos finais do ensino fundamental. Pelo Prosic, isso é feito de forma intensiva, por 2 anos. Yago estĂĄ agora no chamado fluxo 4, cursando juntos o 8Âș e o 9Âș anos.
"Nosso estado tinha uma das maiores quantidade de meninos em idade incorreta na sala de aula. Esse nĂșmero geral era de 39,4%. E para vocĂȘ ter ideia, o ano mais crĂtico, que é o 6Âș, a gente estava com 48,8% de distorção, e isso acionou um alerta", explica o professor Everton Pessan, que trabalha com a formação em lĂngua portuguesa dos professores que irão atuar no Prosic.
"O programa surgiu para tentar mudar esses indicadores. Desde 2019, jĂĄ passaram por nós cerca de 42 mil estudantes, e a nossa distorção geral caiu de 39,4% para 22,5%", disse o professor.
A grande vantagem do Prosic para os alunos, explica Pessan, é acabar os estudos em menos tempo. "Acaba mais cedo, né? Ele adianta os estudos e o que ele quiser fazer lĂĄ na frente. O incentivo é justamente adiantar os seus estudos", ressalta.
As aulas são intensivas e não são como as do ensino regular. Os estudantes recebem uma atenção especial, de acordo com a professora de lĂngua portuguesa Elaysa Lima, da Escola Estadual Poeta Garcia Rosa. "O estudante jĂĄ se sente excluĂdo ali daquele grupo, jĂĄ tem aquele aquele receio de participar das atividades. Muitos sentem que não conseguem, que são incapazes. E aĂ, essas turmas são importantes. A gente faz o trabalho também de autoestima desses alunos, para que eles saibam que podem, que são capazes. O professor, em uma turma regular, não tem como dar atenção a todos os alunos que estão em um nĂvel de aprendizagem diferente. A turma do Prosic ainda tem a vantagem de ter um nĂșmero menor de alunos, o que também facilita", explica Elaysa.
O professor Pessan ressalta que esse cuidado com a autoestima é bastante trabalhado na formação dos professores. "Uma coisa que eu falo aos professores é que nem todo mundo que estĂĄ reprovando ou jĂĄ reprovou, necessariamente tem problemas de aprendizagem. Eu era um menino muito tranquilo em relação aos estudos, mas foi o ano que meus pais se separaram, a gente mudou de cidade, e acabei reprovando. AĂ ficou um caos na minha cabeça. A gente sabe que dentro da bolha social onde eles [estudantes] vivem, de fato acontecem muitas coisas. Então, o que a gente fala para esses professores é não olhar esse menino com repĂșdio, como se fosse fracassar. Se não for a escola, quem que vai abrir as portas para ele? A gente tem que pensar dessa maneira".
Em julho deste ano, o governo federal lançou o Programa de Fortalecimento para os Anos Finais do Ensino Fundamental - Programa Escola das AdolescĂȘncias, que tem como objetivo construir uma proposta para a etapa que se conecte com as diversas formas de viver a adolescĂȘncia no Brasil, promova um espaço acolhedor e impulsione a qualidade social da educação, melhorando o acesso, o progresso e o desenvolvimento integral dos estudantes.
O programa reĂșne esforços da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municĂpios e prevĂȘ apoio técnico-pedagógico e financeiro, produção e divulgação de guias temĂĄticos sobre os anos finais e incentivos financeiros a escolas priorizadas segundo critérios socioeconômicos e étnico-raciais.
Em setembro foi realizado o SeminĂĄrio Internacional Construindo uma Escola para as AdolescĂȘncias, para discutir como o Brasil e outros paĂses estão lidando com a garantia de uma educação de qualidade e quais as principais estratégias para combater a reprovação e o abandono escolar. O Prosic estava entre as iniciativas apresentadas.
Outra ação realizada no âmbito do programa foi a Semana da Escuta das AdolescĂȘncias nas Escolas realizada em maio, quando os estudantes responderam a questionĂĄrios sobre o que pensam sobre a escola, as aulas, os funcionĂĄrios e os colegas. Ao todo, 2,2 milhões de estudantes de 20 mil escolas participaram. Uma das escolas participantes foi, no Rio de Janeiro, a Escola Municipal Nilo Peçanha.
A escola tem um diferencial. Foi transformada em um dos GinĂĄsio Experimental Tecnológico (GET) da prefeitura da cidade. Trata-se de um modelo de ensino que usa a tecnologia para estimular a participação dos alunos e o desenvolvimento de habilidades em diversas ĂĄreas. A intenção é justamente tornar a escola um ambiente mais atrativo e mais conectado à vida dos estudantes.
O professor articulador de projetos do GET Antonio Miranda explica que tanto a escola quanto os alunos ainda estão se adaptando, mas que os resultados tĂȘm sido bons. Um deles é justamente uma maior proximidade e escuta constante dos alunos. "Tudo é chato para eles, chatão como eles falam", brinca. Então, uma das estratégias é permitir um maior protagonismo deles ou, como o professor prefere denominar, uma autoria.
"Um exemplo. A gente tem agora em outubro na nossa feira de ciĂȘncias. Um grupo do 7Âș ano vai trabalhar com fungos. Um aluno me trouxe uma matéria que eu desconhecia completamente, que são fungos que se alimentam de radiação. Foi uma pesquisa feita por ele, no laboratório. Ele foi associando as ideias e buscando por conta própria", explicou, acrescentando que é esse tipo de aprendizagem que o modelo de ensino tenta estimular.
Para Marcelle Muniz, 13 anos de idade, estudante do 8Âș ano, essa é justamente uma das diferenças da Escola Municipal Nilo Peçanha em relação à antiga escola.
"Às vezes, o importante é vocĂȘ aprender. Então, às vezes, o professor tem que se adaptar a esse aluno, que tem mais dificuldade. E como é que vai saber a dificuldade que o aluno tem se não conversar? Por isso é importante ter essa troca. Na minha antiga escola, os professores e os alunos não tinham muito essa troca, a maioria dos alunos tinha medo. Inclusive quando eu cheguei aqui nessa escola, eu realmente fiquei com medo", disse a estudante Marcelle.
Aos poucos, ela foi perdendo o medo. "Até mesmo antes dessa Escuta dos Adolescentes eu percebi que os professores realmente conversam, tem uma troca boa, e isso fez eu me sentir muito mais confortĂĄvel até mesmo para perguntar, porque eu acho que é importante na aprendizagem vocĂȘ perguntar, que aĂ sim, vocĂȘ aprende".
Os colegas de Marcelle concordam. "Ter essa acolhida dos alunos eu acho importante, porque quando não se sente ouvido ou com direito de interagir com o professor, isso pode acabar desmotivando o aluno a estudar", disse o estudante do 9Âș ano, Isaac Filipe, 15 anos de idade.
"A escuta é importante porque a gente pode conversar com os professores, com a diretoria, para falar o que a gente tĂĄ sentindo da escola", disse o estudante do 8Âș ano, Pedro AraĂșjo, 13 anos de idade. "Tem gente que aprende de um jeito. Tem gente que aprende de outro. É bom escutar por causa disso", complementa a estudante do 9Âș ano, Jéssica Maysa Sousa, 15 anos de idade.
Fonte: AgĂȘncia Brasil